O advogado Adílio Domingos dos Santos Neto se despedirá da presidência da 2ª Subseção da OAB-ES no próximo dia 31 de dezembro depois de seis anos no exercício da função. Neste período, para além de qualquer opinião divergente, tornou-se uma importante referência no papel de liderança comprometida com a luta pela defesa da advocacia.
Conhecido entre os pares pelo perfil acessível e de conversação franca, exerceu a responsabilidade delegada nos dois mandatos com a preocupação não somente de representar bem os interesses dos advogados e advogadas inscritos, mas também de estreitar o diálogo com o Judiciário e a sociedade. Pode-se dizer que, em ambos os propósitos, foi muito bem-sucedido.
Como presidente da OAB Cachoeiro de Itapemirim, coordenou número expressivo de projetos importantes, quase todos retratados ao longo dos últimos seis anos nas páginas da revista Advocacia. Igualmente superou, com o apoio de sua diretoria e conselho, adversidades quase inimagináveis, como a pandemia de Covid-19 ou a disposição do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo de encerrar as atividades de fóruns da região.
Deixará como legado realizações que provavelmente serão lembradas com carinho por quase todos os cerca de 1.656 inscritos. Ele conversou com a reportagem para uma última entrevista no final de novembro. A seguir, os principais trechos da conversa.
Ao assumir a presidência, quais eram seus principais objetivos? Como eles evoluíram ao longo dos dois mandatos?
Tínhamos um norte, um trabalho mapeado que consistia na questão da valorização das prerrogativas, o tratamento do tema de forma muito próxima e, principalmente, a abertura e democratização da OAB e de seus espaços para a advocacia e a população em geral, seja por meio das comissões, seja por meio dos eventos realizados. Creio que conseguimos atender ambos os objetivos a contento. Acho que o balanço e a avaliação desta reta final são bastante positivos.
Se pudesse, mudaria alguma coisa?
Se tivesse este poder tiraria do período da gestão a pandemia de Covid-19. Foram praticamente dois anos. Algo que atrapalhou em parte o desenvolvimento dos trabalhos, mas creio que conseguimos, mesmo em meio à crise sanitária, contornar as dificuldades que surgiram e, apesar disso, entregamos um trabalho de qualidade.
Qual o maior desafio enfrentado durante os seis anos de gestão?
Diria que foram dois. A pandemia e o procedimento de tentativa de extinção de comarcas. Estes foram os maiores desafios da gestão, sem sombra de dúvida.
A resposta a estes desafios correspondeu ao que esperava?
Creio que sim. Na pandemia conseguimos garantir o acesso e o funcionamento dos fóruns, das serventias. As audiências se tornando virtuais. A vinda do próprio Processo Judicial eletrônico (PJe), que é um pouco mais recente, mas que começou a ganhar fôlego no meio da crise sanitária, porque vimos como o Espírito Santo estava defasado. E o procedimento de extinção de comarcas, conseguimos evitá-lo basicamente. Se não fosse a mobilização da OAB teríamos hoje 27 comarcas extintas no estado, três destas (Atílio Vivácqua, Vargem Alta e Muqui) na área de abrangência da 2ª Subseção.
Quais foram as iniciativas mais inovadoras implementadas?
Acho que a mais inovadora foi a atenção dada à nossa comunicação. A instituição do nosso portal, que hoje passa de 300 mil acessos mensais. Isto sem perder a pegada da revista Advocacia. Voltamos antes do portal com a revista, em versões física e digital, disponibilizando acesso aos colegas advogados e advogadas a todas as realizações e atividades da Subseção por meio dos conteúdos disponibilizados na publicação. Comunicação é muito importante. As pessoas precisam saber e compreender o que está acontecendo. Também virtualizamos nosso atendimento por meio da implantação de atendimento via WhatsApp. Então creio que a comunicação, bem como a facilidade de acesso a Subseção e às notícias da Ordem foram os pontos mais inovadores.
Como avalia a evolução da relação com o Judiciário?
Avalio de forma extremamente positiva. E falo isto não por autoavaliação. Falo por ouvir de servidores e magistrados. Estes, em várias oportunidades, registraram como a atual gestão dialogou melhor e teve bom trato com os atores públicos com os quais a OAB se relaciona. Claro, tivemos momentos pontuais de algum enfrentamento mais tenso? Tivemos. Não poderia ser diferente. Mas, no geral, conseguimos fazer as tratativas com base no diálogo e em uma boa política. Então o saldo foi, na minha opinião, muito positivo.
Que medidas foram tomadas para promover a inclusão e diversidade?
Sobre a inclusão, posso citar como maior marco o acesso à nossa sede. Tínhamos um edifício que não contava com banheiro com acessibilidade. É possível que alguém considere este apontamento um ato singelo. Pode ser para nós, que graças a Deus conseguimos ter acesso a qualquer lugar. Mas, considere a importância de ter um banheiro com acessibilidade para uma pessoa com deficiência (PcD) que depende de uma cadeira de rodas ou de uma muleta. É algo que transforma a vida dela naquele momento. Não tenho a menor dúvida disso. A respeito da diversidade, considero como marcos importantes a criação das comissões da Diversidade e da Igualdade Racial. Tivemos, por exemplo, a oportunidade de realizar dois simpósios sobre igualdade racial, com debates de altíssimo nível. Então creio que conseguimos realizar um bom trabalho.
Quais foram os principais avanços em termos de capacitação?
Tínhamos durante a pandemia “lives” e eventos virtuais via “Zoom”. Assim que tivemos oportunidade, retornarmos para o sistema presencial e até mesmo o híbrido. Honestamente, dada a quantidade, teria dificuldade de listar de cabeça quantos cursos, palestras e capacitações fizemos nos últimos seis anos. Posso citar, no entanto, que trouxemos para Cachoeiro de Itapemirim os maiores nomes do direito previdenciário, por meio da Comissão de Direito Previdenciário. Trouxemos o Flávio Martins, um dos maiores constitucionalistas da atualidade, presencialmente, por meio de parceria com a Damásio, bem como eventos como o Luso Brasil, um congresso híbrido envolvendo Brasil e Portugal, em duas edições. Fizemos cursos de capacitação à jovem advocacia presenciais, com professores de São Paulo, do Espírito Santo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Noventa e nove por cento destes cursos foram gratuitos. Um ou outro teve uma pequena taxa de inscrição para custeio, por exemplo, da passagem áerea de um palestrante. Mas, em sua maioria, quase todos foram de graça, sem o advogado e a advogada inscritos pagarem nenhum centavo.
Que iniciativas foram implementadas para aproximar a 2ª Subseção da OAB-ES da sociedade civil e aumentar a transparência da instituição?
As nossas atuações com o poder público aconteceram em mais de um episódio, de modo que impactaram sobremaneira a vida do cidadão e da cidadã, não somente de Cachoeiro de Itapemirim, mas das demais cidades que compõe a 2ª Subseção também. Em Cachoeiro, posso citar como mais marcantes os episódios do IPTU e do empréstimo pretendido pela prefeitura municipal. Mas, também tivemos atuação em Vargem Alta, Mimoso do Sul, Muqui e Atílio Vivácqua. Tivemos, por exemplo, um grande apoio aos advogados procuradores municipais em Vargem Alta, em um evento isolado que ocorreu na região. Foi um problema sério que envolveu estes profissionais. Atuamos firmemente. Em Mimoso do Sul, no início de 2023, com o episódio das enchentes, atuamos desde o primeiro momento. Em Muqui e Atílio Vivácqua também agimos do ponto de vista político, com as cidades, os municípios. Creio que estas são formas de aproximar a Ordem, o Sistema OAB, do cidadão e da cidadã da região.
Que projetos ou programas iniciados durante sua gestão o senhor considera fundamentais para serem continuados?
Creio que o cuidado com a questão das prerrogativas precisa ser mantido e mesmo ampliado. Não somos detentores de soluções definitivas. O tempo traz a necessidade de ampliação, já que o número de advogados e advogadas inscritos vai crescendo ano após ano. Também acho que a boa comunicação que a 2ª Subseção tem hoje precisa ser mantida. Creio que a capacitação precisa ser mantida e ampliada. E, principalmente, a questão das prerrogativas e do bom diálogo que construímos com o sistema de justiça nos últimos anos. É algo que precisa ser preservado e mantido.
Olhando para o futuro, quais são os principais desafios que vê para a advocacia regional e como a 2ª Subseção da OAB-ES deve se preparar?
A nossa classe cresce a cada dia em número de profissionais. Isto exige do sistema OAB e da 2ª Subseção, particularmente, um atendimento e um trabalho a cada dia mais profissionalizado. Creio que este seja o maior desafio que as gestões do sistema OAB no Brasil todo terão que enfrentar. Vão ter que estar preparadas para o crescimento da classe e os desafios e oportunidades que isto representa.
Qual mensagem deixa para os jovens advogados?
Não desistam. Perseverem, se capacitem, guardem a ética e as prerrogativas. Se animem. Combatam o bom combate que a recompensa profissional é natural e ela vem. Não coloquem o dinheiro acima de tudo como norte na vida de vocês. Coloquem sim, como meta, a boa prestação de serviços ao seu cliente, seu constituinte, agindo com ética, com probidade, que o resultado virá.
Publicado na revista Advocacia, edição nº 11