No momento que a presente edição era finalizada, ainda no final de outubro, havia a expectativa de que a reforma tributária fosse votada no Senado na primeira quinzena de novembro. O cronograma foi divulgado no último dia 11 de outubro pelo relator do texto, o senador Eduardo Braga. No entanto, desde que a proposta passou a tramitar no Congresso, a Comissão de Direito Tributário da 2ª Subseção da OAB/ES tornou-a matéria de discussão mensal, segundo contou o advogado Marcos Vinicius Martins, coordenador do grupo. “A reforma é objeto de discussão a cada reunião. Tanto que foi tema de uma mesa redonda no dia 21 de agosto deste ano a convite do Centro Universitário São Camilo, com participação de três membros da comissão”, revelou.
Marcos Vinicius enumera como potenciais pontos positivos do projeto a possibilidade de simplificação das obrigações; a clareza na tributação tanto para quem cobra quanto para quem paga; o provável aumento da arrecadação; e, não menos relevante, o gradativo fim da guerra fiscal entre os estados. Para o coordenador da Comissão de Direito Tributário são pontos negativos, contudo, o presumível aumento da carga tributária; a extinção de benefícios fiscais regionais, com a provável perda de investimentos que, como lembra, “só foram viabilizados com tributação diferenciada”; as dúvidas sobre como operacionalizar o cashback sobre o consumo; e, claro, a transição com dois regimes vigentes e cujo prazo ainda pode ser prorrogado.
“Sabemos que nossa região é economicamente associada ao setor de rochas ornamentais, mas também depende do comércio e serviços em geral. Em razão disso, diversos benefícios fiscais atualmente existentes estão em risco de extinção com a aprovação da reforma, o que pode resultar em redução de competividade com empresas que tenham menores custos de produção e logística, a exemplo do comércio varejista online. Além disso, é esperado aumento da carga tributária considerável para o setor de serviços, que não possui tantas despesas a deduzir como no comércio e na indústria”, explica.
A apreensão de Marcos Vinicius reverbera a preocupação de outros tributaristas da região. O advogado Hemerson Maia, por exemplo, defende que o texto da reforma precisaria definir de forma clara a alíquota para o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) sobre os serviços. “Este setor não poderá aproveitar a sistemática de tomada de créditos ampla, na forma proposta, já que suas operações, na grande maioria dos casos, não envolvem uma cadeia produtiva, o que pode implicar em demasiado aumento da carga tributária e gerar desigualdade, o que viola regras constitucionais”. Ele também faz outra observação importante. “A região de Cachoeiro de Itapemirim, especificamente, possui aproximadamente 17 mil empresas. Desse montante, 98% estão no Simples Nacional, um regime unificado que facilita o tratamento da escrituração e o pagamento dos impostos. Uma mudança no atual formato pode implicar em severos problemas, com o fechamento de negócios e consequente extinção dos postos de trabalho”, diz.
Como Hemerson lembra, o texto do projeto propõe extinguir cinco impostos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins), que serão substituídos pelo IVA dual: a Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS). “Estes são os principais vilões do contencioso tributário no Brasil”, resume.
Na mesma linha, o também advogado tributarista e contador Danildo de Oliveira vê com preocupação o potencial impacto das mudanças para a região sul do Espírito Santo. “Tenho a percepção de que a proposta de reforma poderia ter sido melhor. Na verdade, esperamos por muitos anos e, ao final, recebemos um projeto que foi aprovado pela Câmara de forma acelerada, sem profundas discussões com os setores da sociedade”, observa. Faltou, por exemplo, segundo Danildo, estudos mais aprofundados sobre os impactos orçamentários e também sobre as consequências positivas e negativas que afetarão os setores empresariais e os entes federativos. “Em minha opinião, há uma violação do pacto federativo e os municípios serão os maiores prejudicados”.
Para além, no que se refere ao setor de serviços, o advogado busca demonstrar a ocorrência de possíveis majorações da carga tributária usando um cálculo relativamente simples. “Se tomarmos por base o encargo atualmente suportado por empresas prestadoras de serviços profissionais, tributadas pelo Regime de Lucro Presumido, que hoje sofrem, nesse regime, uma tributação de 16,33 % sobre a Receita Bruta (IRPJ 4,80%; CSLL 2,88%; PIS 0,65%; COFINS 3% e ISS supondo uma alíquota de 5%), com a Reforma Tributária, essas empresas passariam a ter uma tributação de 33,13% (IBS e CBS alíquota-padrão estimada 25,45%; IRPJ ,4,80% e CSLL 2,88%)”.
Continuando o raciocínio, Danildo destaca que é possível identificar na simulação apresentada uma elevação da carga tributária do segmento analisado de 102,90%, e que as atividades de serviços, normalmente, não possuem operações que gerem volumes satisfatórios de créditos do imposto a deduzir cobrados em etapas anteriores, valores esses que, a partir da reforma, poderão ser utilizados para a diminuição do imposto a recolher. “Esses fatos evidenciam um panorama prejudicial aos prestadores de serviços”. O tributarista complementa sua argumentação observando ainda que o setor de serviços é responsável por 70% do PIB brasileiro. “Por essa base, podemos concluir que 70% do PIB pode sofrer aumento de tributo”, pondera.
Ele, no entanto, assim como os colegas, é realista ao apontar que a aprovação da reforma terá, certamente, impacto considerável no exercício da atividade dos advogados tributaristas da região. “Advogados tributaristas e também contadores tributaristas serão significativamente acionados durante a implantação e aplicação da reforma. Haverá buscas por estes profissionais para a implementação e para uma nova adequação dos contribuintes ao sistema tributário nacional”, prevê.
Por esta razão, como destaca Marcos Vinicius Martins, “é possível que o contencioso tributário aumente, mas o caráter preventivo da advocacia tributária, a exemplo do planejamento, ganhará ainda mais espaço com a unificação de tributos”. A consultoria já é uma rotina para os tributaristas, observa Hemerson Maia. “Isso tende a aumentar e com ótimas oportunidades”, estima.
Publicado na revista Advocacia, edição nº 09