“A mudança não virá se esperarmos”

Conselheiro da 2ª Subseção da OAB-ES, o advogado João Augusto Faria dos Santos discute a importância da representatividade e da inclusão no ambiente jurídico

Em um cenário jurídico frequentemente descrito como difícil, a trajetória do advogado João Augusto Faria dos Santos ressoa uma narrativa de resiliência, representatividade e a imperativa busca por equidade racial. Atuando como conselheiro da 2ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil no Espírito Santo (OAB-ES), ele, com sua perspectiva aguçada, se propõe a discutir questões que permeiam não apenas os corredores do Direito, mas reverberam nas estruturas sociais brasileiras.

Na entrevista a seguir, o conselheiro da OAB Cachoeiro de Itapemirim expõe as camadas de desafios e oportunidades que se apresentam para advogados negros no contexto atual. Ele reflete sobre a influência de sua identidade racial em sua jornada profissional, a importância vital da diversidade racial nos conselhos e comissões da OAB, além de abordar as práticas de inclusão racial que podem ser adotadas por escritórios de advocacia.

Como sua identidade racial influenciou sua trajetória na advocacia?
De muitas formas, especialmente no aspecto de estar sempre sendo testado em relação a minha capacidade intelectual. Negros, em qualquer profissão que dependa do intelecto, sempre serão vistos com desconfiança até que provem com sobras a sua capacidade.

Você já enfrentou algum tipo de discriminação racial durante sua carreira jurídica?
A resposta da primeira questão também responde parte desta segunda, somada aos demais fatores. Todo negro sempre sofre algum tipo de discriminação todos os dias.

Como avalia a representatividade negra no ambiente jurídico atual?
Ainda é muito pequena, quase ínfima se olharmos particularmente para os componentes dos tribunais, bem como do Ministério Público.

De que forma a advocacia pode atuar como uma ferramenta de combate ao racismo?
Se posicionando com firmeza, adotando práticas antirracistas.

Qual é a importância da diversidade racial nos conselhos e comissões da OAB?
A importância é vital para que realmente haja uma verdadeira transformação do quadro que ainda vemos atualmente. Já é um alento a resolução do Conselho Federal da OAB (CFOAB) que determinou as cotas de raça e de gênero na composição das chapas que disputam as eleições, tanto das seccionais, quanto das subseções.

Como o tema da diversidade racial é tratado dentro da 2ª Subseção da OAB/ES?
O tema é tratado diretamente dentro da Comissão de Igualdade Racial, da qual tenho o orgulho de participar.

Na sua perspectiva, o que pode ser feito para encorajar mais jovens negros a seguir carreira na advocacia?
A bem da verdade, eu entendo que no Brasil há uma quantidade absurdamente alta de cursos de Direito, o que tem tornado a carreira de advogado sucateada, em particular em relação ao mercado. Um exemplo disso é a difusão da advocacia dativa, cujos honorários são aviltantes.

Como a interseccionalidade de raça, gênero e outras identidades pode ser melhor abordada na advocacia?
Através da conscientização.

Quais seriam as melhores práticas para escritórios de advocacia abordarem a inclusão racial?
A melhor prática sempre será a oportunidade dada, sem preconceitos.

Em sua opinião, quais são os maiores desafios e oportunidades para advogados negros na atualidade?
O desafio será sempre estudar e se capacitar mais e mais, lembrando que o negro para ser considerado igual (ao branco) ele, no mínimo, terá que ser muito mais capacitado. As oportunidades estão aí, junto com um bom marketing pessoal.

Como você acredita que esses obstáculos podem ser superados?
A resposta anterior se encaixa bem também nesta questão. Até aqui, o negro tem tido progressos não por mera benevolência do branco, mas pelo seu próprio esforço e pelo letramento racial. Como disse Barack Obama: “A mudança não virá se esperarmos por outra pessoa ou outros tempos. Nós somos aqueles por quem estávamos esperando. Nós somos a mudança que procuramos.”