Em uma decisão surpreendente na última terça-feira (4), a Ordem dos Advogados Portugueses (OAP) decidiu romper unilateralmente o acordo de reciprocidade que mantinha com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O acordo permitia a inscrição de advogados brasileiros nos quadros da advocacia de Portugal e vice-versa. Essa informação foi fornecida pela própria OAB e divulgada pelo jornal O Globo.
O acordo, ratificado em 2008, abria as portas da profissão para os brasileiros em Portugal ao permitir a inscrição de advogados na OAB sem a obrigatoriedade de estágio ou prova. Segundo o portal Portugal Giro, atualmente existem cerca de 3,1 mil advogados brasileiros inscritos na OAP, representando 10% dos associados. No Brasil, há cerca de dois mil advogados portugueses aptos a exercer a advocacia.
Os advogados brasileiros estão entre os profissionais liberais que mais migram para Portugal, atuando de forma independente ou em escritórios associados. A decisão da OAP, embora não afete os já inscritos e aqueles com processos de inscrição em andamento, impede o desenvolvimento de novos projetos de expansão de escritórios e de internacionalização de empresas.
Advogados brasileiros atuam, não raro, no mercado de imigração para Portugal, incluindo em transações imobiliárias. A presença crescente de advogados brasileiros, segundo o Globo, estaria causando insatisfação nos profissionais locais.
A OAP justificou a decisão alegando que as normas jurídicas de ambos os países “já não são sequer equiparáveis”, citando as diferenças na prática jurídica em Portugal e no Brasil, bem como a dificuldade dos advogados brasileiros em se adaptarem ao formalismo e plataformas digitais judiciais portuguesas.
A Ordem Portuguesa também mencionou dificuldades de adaptação dos profissionais brasileiros ao regime jurídico português, à legislação substantiva e processual e às plataformas jurídicas em uso corrente.
Apesar do rompimento, a OAB afirma estar determinada a retomar o diálogo com a OAP e defender os direitos dos advogados brasileiros. A OAB entende que a OAP está sob pressão governamental, conforme informação divulgada no portal oficial do Conselho Federal.
“A OAB tomará todas as medidas cabíveis para defender os direitos dos profissionais brasileiros aptos a advogar em Portugal ou que façam jus a qualquer benefício decorrente do convênio do qual a Ordem portuguesa está se retirando”, declarou o advogado Beto Simonetti, presidente nacional da OAB, em manifestação divulgada pelo Conselho Federal.
Além disso, Simonetti destacou a necessidade de retomada do diálogo, respeitando a autonomia da OAP, mas compreendendo as dificuldades enfrentadas pela entidade europeia. Ele criticou ainda a mentalidade que levou ao rompimento do acordo, citando a superação da “mentalidade colonial” e reiterando a necessidade de combater qualquer tipo de discriminação e preconceito.
O impasse levanta uma questão importante sobre a mobilidade dos profissionais entre os dois países e a necessidade de atualização dos acordos bilaterais para se adaptarem à realidade jurídica atual de cada nação. O rompimento do acordo destaca as diferenças na prática jurídica entre os dois países, abrindo um amplo debate sobre a reciprocidade e cooperação entre as profissões.
Embora o impacto imediato seja limitado aos advogados brasileiros que planejavam exercer a profissão em Portugal, a decisão pode ter repercussões mais amplas. A possibilidade de novos obstáculos para advogados brasileiros em Portugal, e talvez vice-versa, poderia afetar a mobilidade profissional e a diversidade nos escritórios de advocacia em ambos os países.
As próximas etapas desta controvérsia serão de grande interesse para a comunidade jurídica internacional. O desenlace dessa situação certamente vai definir precedentes para futuras situações semelhantes e colocar a luz sobre a questão da reciprocidade e da cooperação entre profissionais de direito no cenário global.
O embate destaca, acima de tudo, a necessidade de diálogo e cooperação mútua na busca de uma solução que respeite os direitos e garantias de todos os envolvidos. A OAB, mantendo sua postura de lutar pelos direitos dos advogados brasileiros, promete não se abalar diante do desafio e persistir na busca de um entendimento favorável.